ESCALAS
Nunca fui de ambições gananciosas. Uma ou duas que considero modestas, escritas outrora num caderno e rasuradas pela vergonha de, talvez, não ser capaz de um dia as concretizar. Hoje estão sublinhadas, mas não as profiro em voz alta. Não preciso. Nas mãos trago o que nelas cabe. O que transborda fica para trás e não o choro. Ao atravessar a Europa em busca de um marcador muitas foram as coisas que das minhas mãos caíram. Muitas vezes leio histórias de pessoas com sonhos - sejam eles de que tamanho for - e com medo de correr atrás deles. Com medo que o caminho seja longo demais para levar atrelado tudo aquilo que empilharam ao longo de todos os anos de vasta esperança mas parca conquista. Não há nada para levar, não há nada que fique que não possa esperar. Com 20 anos e o rótulo de mimada às costas vim sozinha para um país no qual nunca tinha estado a quatrocentos mil quilómetros de distância. Sem nada saber de rendas, senhorios e contratos assinei aquele que mais me proporcionou a sensação de Casa. Escolhi tudo sozinha, sempre com o apoio daqueles que cabem sempre nas minhas mãos. Eu cresci aqui. Tornei-me em muito do que sou aqui. Por entre três idiomas que não são os meus mas que embalam o meu dia-a-dia, no meio de gente que não é a minha mas que me tem, numa casa que não é minha mas que é Casa. Eu cresci e as mãos ficaram mais pequenas. Menos coisas e pessoas consigo trazer, escorregar por entre a distância é - tantas vezes - inevitável. E tão grande que é o que das minhas mãos não caí.
Patrícia Lima
23/04/2019



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